O pretenso perigo passou

-- Então e o nosso querido 'Commercio da Louzã' nunca mais voltou a botar faladura sobre o astro cabeludo, professor?

-- Que eu tivesse visto, apenas a 2 de Junho, e o engraçado é que, segundo eles, ainda andaria gente de nariz no ar a ver se descobria uma pontinha do cometa. Ou bem que as notícias tardavam em chegar à Lousã, ou se chegaram ouve gente que não acreditou. Ou então a curiosidade era mais forte que o medo. Vamos lá saber, nós, hoje. Às tantas tal notícia até foi engendrada apenas para abrir as portas a alguma personagem malquista ao director do 'Commercio', isto se atentarmos na indirecta do final desta curta notícia:

'O COMETA -- De nariz no ar, todas as noites por ahi andam os curiosos, e nós pertencemos a esta classe, a farijar o cometa que se apresenta pouco visivel devido ao seu brilho ser offuscado pelo luar, o que causa certa arrelia, por nos vermos privados dum espectaculo... raro e gratuito. Ainda assim, este anno apparecerám mais dois destes astros vagabundos do espaço, como agora é moda dizer: O cometa d'Arreste, cuja rotação demora 6 annos e 8 mêzes, e que se verá em Junho, e o Vico, que fará a sua aparição em dezembro, e que gasta na sua rotação apenas 5 annos e 5 mezes. Todos estes vagabundos do espaço, vá lá outra vez a moda, aparecem lá longe, e ante em pouco desaparecem; só um outro astro, apagado cometa, planeta, ou coisa que o valha, que aqui apareceu ha annos, e cujos effeitos não sám nada bons, não desaparece nem á mão de Deus Padre. Só se for em balão'. (nota 26)

Passados uns dias, a 16 de Junho, encontrei uma referência rápida ao cometa, numa outra secção do 'Commercio', também em diálogo, e que se chamava 'Vida Alheia'. Vinha assinada por Paulino Junior, seria o filho do autor dos 'serões', ou o mesmo Paulino agora com um pseudónimo mais rejuvenescido? Não sabemos.

-- Esta história do cometa foi mesmo gira. Foi das que gostei mais de ouvir, professor. Mas olhe que também preguei atenção numa catilinária contra os padres jesuítas, que o professor Vergílio, se a memória me não falha, não acabou de nos ler...

-- Tu, em tudo o que cheire a malhanço nos padres, não perdes uma, Zé Cristão. Como o teu apelido engana! Mas hoje estás com azar, que não trouxe esses jornais. Amanhã pegamos na tal parte, que já nem sei qual era. Tenho ideia que até havia mais do que um texto a zurzir na igreja. Então até amanhã...

FIM DO CAPÍTULO 6