Viva a Liberdade! Mas vocês a pé e eu de carro! |
Capítulo II Página 2
-- Não sei se terão chegado a ir, e se foram é sinal de tolerância, uma das virtudes da democracia. Antigamente as coisas eram mais a doer. Se tiverem paciência para ouvir este pedaço aqui já vão perceber a diferença. Ora reparem como o jornal fazia na tal coluna a apologia do regime republicano: 'Hoje quero explicar umas coisas a propósito dumas perguntas que me fez agora ali fora o sr. Manuel Caseiro. Preguntou-me elle que já que se fallava tanto em República, se ella um dia vier se isto não ficará na mesma. Se os republicanos não farám o mesmo que fazem os outros. Se também não terám afilhados a quem recompensar. Se não quererám também apanhar boas postas etc., etc. A tudo isso é fácil responder. Primeiro que tudo os republicanos não teem compromissos. Quem é republicano não o é pela barriga. É o pelo seu amor, pela sua dedicação pela pátria. E pela vontade que teem de ver o nosso paiz bem governado, bem administrados os nossos dinheiros; que o commercio, a agricultura, as indústrias vivam desafogadamente e enriqueçam a nação. Se quizessem apanhar boas postas, entám faziam-se monárquicos, galopinavam votos, diziam bem da monarquia, defendiam os grandes e calcavam o povo. Se tal fizessem seriam bem recompensados. Comeriam á larga dos cofres públicos, que tanto vale dizer á custa do povo. -- Pois decerto, disse o João da Rosa, quem entra com o dinheiro somos nós. -- Ora os republicanos somente se prejudicam. Gastam o seu tempo, a sua saúde e até o seu dinheiro, para proclamar ao povo quaes são os seus direitos, a combaterem quanto podem as roubalheiras que fazem lá do alto; a procurarem para a sua pátria melhores dias. E além desses sacrifícios todos, ainda sam perseguidos, maltratados, insultados por aquelles a quem não convém que se saibam os processos de que usam para se arranjarem. Quando um dia a Republica fôr governo, não vam lá pedir empregos, porque, repito, sam desinteressados. Se quisessem viver á barba longa, não eram republicanos. -- Sim, nesse caso é bom de compreender as coisas, disse o Domingos Moleiro'. -- Só um segundo, enquanto enxoto o raio das borboletas... -- Ó professor, já reparou que o fundo desta página é igual ao do banner lá de baixo que diz que a Lousã é um paraíso ecológico? -- E se estivesses calado, não era melhor? Essa observação não passa de um truque publicitário muito baixo. Deixa continuar o professor... Podemos prosseguir, então? '-- Além disso, como já aqui vos disse duma vez, se bem me recordo, um presidente da Republica é só elle a ganhar, e ganha menos num anno de que o rei num mês. E na monarquia como agora em Portugal, ganha o rei, ganha o tio do rei, ganha a mãe, ganha a avó. Se o rei amanhã casar, nós é que fazemos as despezas do casamento, damos um dote á noiva e elle começa logo a ganhar. Apenas nasce o primeiro filho, logo tambem começa a vencer um tanto por dia. -- Então se um rei tiver muitos filhos é uma lastima, retrocou o João Russo. -- Sem duvida, pois que todos ganham. -- Como pode pois o povo erguer a cabeça, comentou o Teotoneo Maneta. -- E na Republica só o presidente é que ganha? Nem mulher, nem os filhos, nem a familia, perguntou o Joaquim do Fundo. -- Claro que assim é. E mais. O Presidente é eleito pelo povo, por uns tantos annos, que podem ser trez, quatro, ou o que se combinar. Se elle governou bem, está, se governou mal, sai. No fim de acabar o seu tempo, ha outra vez eleições, e é escolhido outro. Na monarquia, quer o rei saiba quer não temos de aguenta lo enquanto elle for vivo. Morre elle, succede-lhe o filho mais velho, embora esse filho nada saiba do governo da nação, embora seja mau, embora tenha todos os defeitos. -- Isso assim é que não tem geito, comentou o sr. João da Rosa. Então nós é que lhe pagamos e havemos de nos sujeitar em logar de escolher. Já vejo que a ideia republicana é muito melhor por todos os principios. -- Mas então, interrogou o João da Azenha, porque é que os monarquicos não se passam tambem para a republica, visto ser muito melhor? -- Porque isso é que lhes não convem. Porque no governo republicano não podem elles comer á tripa forra. Quem o quizer ganhar ha de trabalhar. Ha de viver do seu trabalho e não á custa dos que trabalham, sem elles fazerem nada. -- Ah! isso sim, continuou o João da Azenha. Já percebo: esses meninos bonitos que teem uns poucos de empregos sem nada fazerem, depois hão de ficar só com aquelles que possam occupar, e lá se vai de todo os seus grandes rendimentos que os fazem ricos enquanto outros andam a moirejar para morrerem de fome! -- Exactamente. -- Pois agora, disse o Joaquim da Quinta, já estou sciente. Voltem cá esses taes monarquicos com lampanas que eu os ensinarei. Hei de fallar-lhes logo pela porta dianteira. Venham cá pedir-me os votos, venham cá dizer mal dos republicanos que verão a resposta que levam. Como a gente não sabe dessas coisas, elles tratam de nos ingrolarem. Pois que venham para cá, que veem bem encaminhados. 'Bem, continuou o sr. Antonio, vejo que vocemecês me compreenderam muito bem, e que todos aproveitamos o nosso tempo. Para a outra vez pois, fallaremos de eleições. -- Isso, isso, exclamou o João Russo. Explique-nos isso, que é para a gente estar preparada para quando nos vierem azoinar aos ouvidos com aquellas. -- Bem. Por hoje ficaremos por aqui!' (Nota 7) |