Vista geral do mercado, após a construção do pavilhão do peixe e antes do alargamento da Rua
Olímpio Nicolau Fernandes. Foto captada do cimo da actual Rua Padre António Vieira.
Note-se, em primeiro plano, a pequena capela, ainda hoje existente, na Cerca da Misericórdia,
ao lado da qual foi construído o novo elevador. Repare-se ainda nas traseiras dos Paços do
Concelho, na desaparecida Torre de Santa Cruz e no edifício dos Correios, incendiado
em 1 de Janeiro de 1926, e que viria a ser substituído pelo actual.
Era,
pois, imperiosa, a solução do problema. E, em 9 de Junho de 1923, é nomeada
em sessão de Câmara uma comissão para estudar a sua construção, "pois
o Mercado D. Pedro V não satisfaz as exigências da cidade, não só pelo seu
aspecto miserável, como pelas suas condições higiénicas, como ainda pela sua
pequena capacidade", sendo na reunião de 26 de Novembro discutida a memória
sobre o projecto de um novo mercado, tendo-se deliberado melhorar o existente,
em detrimento da construção de um novo no Terreiro da Erva.
Em
18 de Setembro de 1924, a vereação toma conhecimento do ante-projecto, cujo
relatório elaborado pela comissão nomeada para o efeito é transcrito na acta
do Senado de 24 de Novembro, sendo e estudo do Engº Abel Urbano. Nele se previa
o alargamento da Rua Olímpio Nicolau Rui Fernandes, ao tempo uma estreita artéria,
alargamento que seria feito à custa do recuo da superfície do mercado, que
avançaria para o lado contrário, com o aproveitamento da barreira confinante
com a Rua da Fonte Nova em patamares e uma escada de ligação, bem como a
construção de novos pavillhões. Para a sua concretização, deliberou-se em
10 de Dezembro contrair um empréstimo de 2.000.000$00. O projecto definitivo
foi concluído pela Companhia Construtora de Cimento, de Lisboa, em 1925,
implicando o desaparecimento total das estruturas então existentes, e a construção
de dois pisos, tendo o seu exterior interessantes pormenores arquitectónicos.
A
abertura do concurso é anunciada na sessão de 26 de Março de 1925, e
concretizada no mês seguinte. No entanto, fica deserto, relatando a Gazeta
de Coimbra, no dia 15 de Outubro: "Por falta de concorrentes ao
concurso aberto pela Câmara para a construção do novo mercado está
inteiramente posta de parte a ideia da actual Comissão Municipal resolver este
assunto", para acrescentar: "O mercado que aí temos é bom que
desapareça o mais depressa possível, pois está longe de corresponder às
necessidades de Coimbra. É mesmo o que mais nos envergonha, tão mesquinho é".
Por
sua vez, O Despertar, escrevia, em 15
de Dezembro: "A actual Câmara procurou resolver o problema da construção
de um novo mercado. Decidiu-se que ele fosse reedificado no mesmo local onde
actualmente se encontram os pardieiros que, para vergonha nossa, servem de
mercado. Feitos os estudos necessários, pôs a concurso a construção, mas sem
resultado algum". E apresenta o motivo: "Os concorrentes não
apareceram, pela simples razão de que ninguém se dispôs a sacrificar elevados
capitais numa empresa sem garantias de espécie alguma". Continuando,
preconiza a localização ideal na Rua da Sofia, entre a Travessa do Terreiro da
Erva e a Rua do Carmo, enaltecendo as vantagens, incluindo as financeiras, e
defendendo igualmente o prolongamento da Avenida Sá da Bandeira até aos
Correios, o que seria "um admirável melhoramento".
Procedera-se,
entretanto, no ano de 1924, à mudança da Fonte Nova para junto do mercado,
encostada ao muro da rua que tem o seu nome. Até então, encontrava-se no início
da Avenida Sá da Bandeira, no local onde seria construído o prédio em que
viria a funcionar o posto das Caixas de Previdência.
Afastada,
então, a hipotese da reconstrução do velho mercado D. Pedro V, vem, em
Janeiro de 1926, um vereador, Álvaro da Costa Morais, submeter à apreciação
da Câmara, a proposta da criação de dois mercados, para substituição do
antigo: um, no Terreiro da Erva, com frente para a Rua da Sofia, e um outro ao
fundo das Escadas do Liceu, em parte do local hoje ocupado pelas instalações
académicas, junto à Praça da República. Esta ideia não seria aprovada, como
nos conta a Gazeta de Coimbra de 15 de
Maio desse ano, que nos informa sobre o parecer da Comissão de Obras e de Finanças
acerca do assunto. Embora louvando o interesse demonstrado pelo vereador, era de
opinião de que não se justificava ainda a existência de dois mercados,
manifestando-se igualmente contra a construção no Terreiro da Erva, por ser
excêntrico e implicar grandes verbas para as expropriações a fazer para a sua
edificação. O mesmo jornal, em 22 de Maio, noticia ter sido abandonada
definitivamente a ideia de aí ser construído um mercado.
O
facto de não terem aparecido concorrentes para a reconstrução do mercado, não
iria impedir a Câmara de prosseguir as diligências necessárias para a solução
do problema, embora em moldes diferentes dos pensados. E, de acordo com os
objectivos, é aprovada, em 14 de Outubro de 1926, uma proposta do presidente
para contrair um empréstimo destinado a esse fim, sendo sancionado, na semana
seguinte, o orçamento para o efeito.
E,
em 26 de Junho de 1927, a Gazeta de Coimbra anuncia um novo projecto, da autoria do Engº Abel
Urbano, sendo presidente o Dr. Mário de Almeida. Embora advogando não ser o
melhor local, falando uma vez mais no prolongamento da Avenida Sá da Bandeira,
o articulista declara não querer "entrar no número da grande família dos
empatas", tanto mais que eram
alegadas razões de ordem económica e financeira. E destaca o mais importante:
"Faça-se o novo mercado, que é o que se quer e de que urgentemente
precisa esta cidade, para se livrar dessa tremenda vergonha que aí temos".
Para
a concretização do projecto, a Câmara delega, em 13 de Outubro, no seu
presidente, poderes para a obtenção de um empréstimo na Caixa Geral de Depósitos.
Mais
uma vez, a Associação Comercial de Coimbra, vem perante a Câmara, em 8 de
Dezembro de 1927, através do seu presidente, pedir para que o mercado não seja
aí reconstruído, apontando como alternativa o Terreiro da Erva. No entanto, a
Câmara manteve a sua decisão, que era contrariada por grande parte das forças
vivas, sobretudo comerciantes, "grupos de conimbricenses", secundados
pela então preponderante Comissão de Defesa e Propaganda de Coimbra, e com
vastos apoios da Imprensa local, argumentando-se com o facto de a Rua da Sofia
vir a ser extraordinariamente valorizada com a construção do mercado, que iria
trazer grande vida àquela artéria, que assim se transformaria numa grande rua
comercial. E, é claro, o costumado argumento do prolongamento da Avenida Sá da
Bandeira. É curioso assinalar que, tendo sido destruído por um violento incêndio,
em 1 de Janeiro de 1926, o edifício dos Correios, houve quem advogasse mesmo a
sua não reconstrução, e o prolongamento da Avenida até ao Jardim da Manga,
que nela seria integrada. E não terá sido alheio ao eventual desaparecimento
do mercado o facto de o actual edificio dos Correios, inaugurado em 1939, ter a
sua frontaria virada para o mercado, e não para a Rua Olímpio Nicolau Rui
Fernandes, que lhe daria uma maior evidência e uma perspectiva mais rica do que
aquela que viria a ter.
O
que é certo é que as obras de remodelação iriam avançar. Não a reconstrução
total idealizada em 1925, mas a possível, como nos dá conta o Presidente da Câmara,
Dr. Mário de Almeida, em entrevista à Gazeta
de Coimbra, publicada em 27 de Março de 1928. Nela, o edil explica a
dificuldade da obtenção de empréstimos, tanto mais que outros empreendimentos
vultuosos estavam em execução, o que levava então "a pôr de parte a
ideia de construir por agora o novo mercado, limitando-nos, por isso, a fazer no
actual os arranjos e as modificações que a estética, a higiene e a
necessidade impõem, até que melhores tempos surjam, e se possa resolver
definitivamente o problema", concluindo a entrevista, à pergunta se
vencera a corrente que preconizava reparações e modificações, ou a que
advogava uma nova construção: "Vence sempre a força das circunstâncias".
Iniciam-se
então os trabalhos de remodelação, que iriam prolongar-se por vários anos.
"Principiaram já as obras de transformação do mercado", -noticiava
a Gazeta de Coimbra, em 5 de Abril de 1928 -, "andando-se a
terraplanar o terreno para os tabuleiros que vão ser feitos na encosta para
venda de hortaliças, frutas e flores", relatando no dia 21 o seu
prosseguimento, com a construção dos tabuleiros no declive e a abertura de uma
porta ao cimo da Rua Martins de Carvalho, para acesso ao mercado dos moradores
da Alta, comentando mais adiante: "A Câmara está realizando uma excelente
obra e oxalá que ela corresponda ao que se torna preciso". E o mesmo
jornal acrescenta, no dia 26: "Estão sendo demolidas as barracas (da Rua
Olímpio Nocolau Rui Fernandes), para alargamento desta, a fim de poder ser
assente a 2ª via da linha eléctrica".
Ainda
a Gazeta de Coimbra, escrevia em 25 de
Agosto de 1928: "As obras que se estão fazendo no mercado são mais
importantes do que se supõe", continuando: "Desaparecerão todas as
tendas, barracas e alpendres que ali há. Será feita uma marquise
sobre o mercado e outra sobre o recinto reservado à fruta e hortaliça na
encosta da barreira, fazendo uma entrada para o mercado pelo lado do Colégio
Novo". E faz uma sugestão: "No muro de vedação do mercado do lado
da Rua Olímpio Nicolau Rui Fernandes, ficavam muito bem painéis históricos de
azulejo". E em 9 de Outubro, comenta o mesmo jornal, descrevendo as obras:
"Ficará quase um mercado novo", formulando um desejo: "Oxalá
estejam prontas antes do Inverno". Infelizmente tal não aconteceu, e no
dia 27 de Dezembro, a Gazeta noticiava
a paragem das obras, lamentando as péssimas condições de comodidade do espaço,
e o facto de a chuva e o frio fustigarem quer os vendedores, quer os clientes.