Diário de Notícias
A Morte de Diana
João de Mattos Silva 05/09/1997
A trágica morte de Lady Diana Spencer, princesa de Gales, e o eco que teve na comunicação social portuguesa, em particular nas emissões da televisão do dia de ontem (domingo, 31 de Agosto), suscitam-me três breves comentários:
- O primeiro, sobre o debate que de imediato despoletou, em todo o mundo, sobre a invasão da vida privada das pessoas públicas, a deontologia jornalística, a falta de deontologia da «imprensa do coração» e dos milhões de voyeurs que a sustentam. É um debate importante - eu diria que importante também para o «aprofundamento da democracia» porque, como disse Paulo Portas, a devassa da vida privada tem a ver com os métodos e mentalidades do totalitarismo - que não se compadece com as tentativas de desculpabilização de ninguém, nem dos jornalistas, nem sobretudo das empresas jornalísticas que, por razões de obtenção de maiores lucros, lhes impõem certos objectivos e induzem a certas condutas, nem do público que se mostrou tão indignado com a tal imprensa mas que não deixa de a comprar e ler avidamente à procura de escândalos e mexeriquices.
- O segundo, para realçar o bom trabalho informativo das estações de televisão portuguesas, com particular destaque para a SIC, e, sobretudo, para lamentar que a mesma SIC tenha aproveitado o debate sobre a questão da responsabilidade ou não da imprensa e, em particular, dos repórteres free lancer que, parece, perseguiam Lady Diana e concorreram para a sua trágica morte para, através dos comentários lidos da responsabilidade do editor ou ditos por um responsável pela área editorial internacional, atacar estúpida, facciosa e falsamente a instituição Monarquia, não a circunscrevendo ao caso britânico. Caso britânico onde tanto os partidos como a Casa Real são culpados, uns porque detentores do poder legislativo e do direito de reformar que não exerceram e outros porque não perceberam que a instituição real ou está com o povo, mormente o que sofre como o percebeu Lady Diana Spencer, que, ao contrário do que a SIC repetiu por ignorância, não sendo de «sangue real» não era uma plebeia, o que quer que isso possa significar-, ou, sendo politicamente útil pela sua independência dos partidos (ninguém poderia acusar a Rainha de, ao visitar um município em época pré-eleitoral, estar a apoiar o partido no poder, como recentemente aconteceu com o dr. Jorge Sampaio), é também politicamente inútil por não estar ao lado do povo de onde vem a soberania. Os exemplos de escândalo que esse senhor apresentou são ridículos e lembrar-lhe-ia os casos do Presidente Mitterrand e da sua vida política passada e da sua vida privada e, muito mais grave, o do ex-Presidente do México, Carlos Salinas, e do seu irmão Raúl, corruptos e enriquecidos à custa do sofrimento e pobreza do seu povo.
- O terceiro comentário é sobre Lady Diana, tentando não ser parcial pela emotividade, para Ihe realçar as virtudes pessoais e políticas, porque era uma pessoa bem formada que soube entender que, sendo princesa e detendo o poder, ao menos poderia chamar a atenção, pela sua projecção, para o sofrimento, a miséria e a dor dos outros e clamar pela sua resolução, e estava a prestar um bom serviço à instituição que representava, ao seu país e à humanidade. Das suas fraquezas pessoais, da sua infelicidade, não direi senão que era a menos culpada, porque não foi educada para as saber ultrapassar em nome do interesse do Estado. Mas ressalto, parafraseando o judicioso comentário de José Pedro Barreto, na TVI, que às pessoas reais se exige que sejam pessoas comuns, mas não se lhes perdoa nada do que acontece a essas mesmas pessoas comuns.