Diário de Notícias
Há em tudo isto uma mistura de totalitarismo com o aproveitamento escandaloso da dor inconsciente de muitas pessoas
Respeitar os mortos e saudar os vivos
Maria Clotilde Cruz (Carcavelos) 21/10/1997
Contrastando saudavelmente com o histerismo de certos massificadores e manipuladores de opinião pública, relativamente ao acidente rodoviário de Diana e do seu último namorado, destacam-se obviamente as análises desapaixonadas, racionais e de bom senso. Felizmente nem toda a gente perdeu a cabeça como os ditos manipuladores pretenderam fazer crer. Eu diria até que se milhões se deixaram seduzir ou alienar pelo espectáculo mediático programado, muitos outros olharam com desprezo a manobra subjacente. Como incauta cidadã apanhada desprevenida no vergonhoso turbilhão que constitui a exploração brutal e desumana do triste acontecimento, gostaria de deixar o meu contributo para desmontar e desmascarar a hipocrisia dos propagandistas da aldeia global que, paradoxalmente, vem tornando o nosso mundo cada vez mais desigual. É, na realidade, importante prevenir os distraídos sobre o que está por detrás de tão insólito procedimento a partir de forças que a todo o custo pretendem a massificação da opinião pública com objectivos inconfessáveis de controlo e domínio absoluto, apresentando-se como os exclusivos detentores da verdade. Tais manobras não são mais que tentativas de lavagem colectiva do cérebro humano, utilizando agora os poderosos meios tecnológicos que a denominada «era da informação» coloca ao seu dispor. Já não se contentam exclusivamente com o controlo do desprevenido cidadão que, julgando-se beneficiário deste desenvolvimento, jamais conseguirá libertar-se da verdadeira teia em que cai de cada vez que utiliza o seu cartão de crédito. Ensaiam agora autênticas manobras colectivas de enviezamento das consciências, como o foi a exploração infame e desavergonhada de um acidente brutal e cada vez mais corrente, como infelizmente é o da morte no asfalto, ainda que desta vez se trate de pessoas que tão bem souberam servir-se destas artimanhas para alcançarem os seus objectivos: viveram luxuosamente, serem invejados pelos néscios e cobiçados por ricos. Há em tudo isto uma mistura de totalitarismo com o aproveitamento escandaloso da dor inconsciente de muitas pessoas, para projecções externas do potencial correspondente aos detentores do poder económico, político, social e cultural de alguns tubarões que sonham com o domínio do mundo. E tanto assim é que até ousam falar na atribuição do Prémio Nobel da Paz a alguém que durante a vida gozou de todos os privilégios, sem nunca arriscar nada e acabar até por morrer na sequência de uma autêntica declaração de guerra à família que a projectou para a eternidade dos facilmente convencidos. Respeitemos os mortos, mas sobretudo saudemos os vivos que querem trabalhar para um mundo melhor, mais verdadeiro, mais humano e com menos injustiças.