Rei D. Carlos foi um paparazzi?

Dinis Manuel Alves*           Jornal de Coimbra 07/09/1997

A trágica morte da Princesa Diana trouxe os "paparazzi" para a ordem do dia. Não sabíamos é que, pela monarquia portuguesa havia passado um rei que gostava muito de fotografia, principalmente de fotografias tiradas secretamente, à sucapa, através de máquina dissimulada na sua gravata! A revelação encontrámo-la num jornal regional, "O Povo da Louzã", que se publicou durante dezenas de anos naquele concelho do distrito de Coimbra. Na sua edição de 3 de Fevereiro de 1945, o periódico vinha com o seguinte título: "A GRAVATA DO REI D. CARLOS - O penúltimo soberano de Portugal usava um plastron que escondia uma máquina fotográfica". No texto, seguia-se o detalhe: "Uma gravata que o rei possuia, que não usava muitas vezes, e que tinha uma particularidade de poucos conhecida. Era um plastron vulgar, encarnado, com riscas brancas, ornado com uma jóia de pechisbeque, uma ferradura, e, encastoada, uma pedra sem brilho, um simples e puro vidro. Mas aquele plastron barato, banal, escondia simplesmente isto: uma máquina fotográfica!".

Adquirida por um familiar do rei em Paris, tinha o tamanho de uma cigarreira das grandes. O jornal gabava-a como "a última palavra da mecânica", um luxo "a que só milionários se permitiam". Como é que o sofisticado "brinquedo" do rei funcionava? "Mandou substituir o alfinete por uma ferradura, tanto da predilecção do monarca, que gostava, como bom português, de cavalos, e o brilhante encravado, que parecia um simples vidro, era a lente. Um tubo de borracha, comprido, que permitia esconder por dentro da camisa e ir até à algibeira das calças, fazia disparar a máquina. O seu portador não tinha mais que, com a mão na algibeira, fazer comprimir a borrachinha para a máquina funcionar e imprimir a chapa. Um botão preto, que parecia segurar o plastron à camisa, servia para mudar o cliché, que pouco maior era que uma unha do dedo polegar".

Não se sabe que fotografias terá o rei tirado com a maquineta secreta. Mas, a serem afirmativas as respostas às interrogações feitas pelo jornal, tivémos entre nós, se não um rei "paparazzi", pelo menos um grande "voyeur": "Quantas fotografias terá o rei feito com a sua máquina fotográfica escondida atrás da banalíssima gravata que nem bonita era para atrair atenções?" - perguntava o jornal lousanense, nos idos de 1945. E continuava perguntando: "Quantas atitudes dos seus íntimos, dos seus conselheiros, não teria registado? Quantas expressões bonitas das damas da côrte ou das mulheres que com ele cruzavam na rua, o rei - que muitas vezes, sem que nele reparassem deambulou pelas artérias da capital como simples mortal - não teria surpreendido? Quantas vezes não teria sorrido ao contemplar os rostos bonitos, despreocupados, das aristocráticas damas ou das mulheres do povo". O jornal conclui a prosa adiantando que o mecanismo fora adquirido por um amador de antiguidades num leilão que se realizara em Vila Viçosa. Enfim, um rei precursor das câmaras secretas que as televisões usam hoje em dia. E a confirmação de que o interesse pelas fotos secretas também é doença que atinge as cabeças coroadas...

 * Texto publicado pelo Jornal de Coimbra (Portugal)

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