COMANDANTE DO AGRUPAMENTO ALFA:

"Processo de paz na Bósnia vai ser muito demorado "

O tenente-coronel Alberto Nunes, 46 anos, oriundo do Regimento de Infantaria 13, de Vila Real, comanda o Agrupamento Alfa, batalhão de militares portugueses em serviço na Bósnia. Depois da experiência vivida no terreno durante estes meses, Alberto Nunes já percebeu que o processo de paz vai levar uns tempos a consolidar-se:

"De certeza que vai ser um processo muito demorado. A situação aqui pelos Balcãs é muito confusa. Em minha opinião, as notícias não conseguem dar uma imagem correcta da situação, tal a complexidade dos interesses em jogo, tal o xadrez de influências no terreno. Depois, há muita coisa que pressentimos se nos escapa. A barreira da língua, a própria reserva das pessoas, tudo isso condiciona, prejudica uma leitura mais fiel da situação no terreno. Não podemos esquecer o nosso estatuto aqui, e é natural que subsista um clima de desconfiança. Para lhe dar um exemplo: ouvimos falar de corrupção, mas se quisermos avançar algo mais, os canais de informação fecham-se hermeticamente".

O comandante do Agrupamento ALFA considera importante a presença das tropas portuguesas na Bósnia: "Por um lado, contribuímos para a visibilidade de Portugal no contexto internacional. E as nossas Forças Armadas ganham uma experiência que de outra forma nunca conseguiriam almejar. É bom lembrar que estamos presentes num teatro de operações real".

Teatro de operações real, mas numa acção de manutenção de paz... "Os militares também participam em missões de paz. Digo-lhe mais: os militares não querem guerra. Ao contrário do que muitos pensam, a Academia Militar não fornece aos seus alunos uma formação militarista, mas sim uma formação humanista". Pela Bósnia, sente-se com mais eficácia o apoio da superestrutura de comando portuguesa: "O apoio que sentimos aqui é maior que em qualquer unidade em Portugal. Quando precisamos de alguma coisa, a resposta surge logo no avião imediato, ou no outro a seguir. E nós também tentamos retribuir esse apoio, ao encararmos tudo com muito profissionalismo, duma forma muito consciente. Notei que o profissionalismo dos nossos jovens é maior aqui, o seu empenhamento e dedicação é maior que numa qualquer outra unidade".

Diz-se, em Portugal, que os bósnios gostam muito dos militares portugueses. Verdade, ou marketing? "Quando dizemos que temos boas relações com as diferentes facções isso é verdade, não foge um milímetro à verdade. Os exemplos são inúmeros, mas deixo-lhe apenas um mais recente. Algumas equipas de militares alemães andaram por algum tempo em operações num município da nossa área de responsabilidade. O Presidente desse município dirigiu-se-nos dizendo que só pretendia efectuar contactos connosco. Creio que isto quer dizer alguma coisa, quer dizer muito mesmo. Um trabalho positivo feito por nós, e que já vinha de trás, dos batalhões que nos antecederam. O nosso carinho para com os civis é muito importante, a ajuda humanitária que prestamos também. Seguindo sempre uma divisa: não prometer nada que não se possa cumprir".

Notou alguma evolução na Bósnia, no período que aqui passou? "Uma grande evolução. Apenas posso comparar a situação referente ao primeiro reconhecimento que fiz, isto em Março de 1998. De então para cá, essa evolução sentiu-se bastante, seja a nível económico, como ainda na maneira de estar das pessoas. Em Março víamos poucas viaturas civis a circular, hoje há bastantes. Os carros apareciam em muito mau estado, hoje encontramos viaturas novas nas estradas, algumas até topo de gama. Resta saber se tal desenvolvimento é sustentado".

[Entrevista com o Brigadeiro Idílio Freire]