BRIGADEIRO IDÍLIO FREIRE, DA BLI:

"Deveríamos ter participado na primeira Guerra do Golfo"

O Agrupamento Alfa, batalhão de tropas portuguesas em serviço na Bósnia, constituído por militares da Brigada Ligeira de Intervenção (BLI), regressa a Portugal nos primeiros dias de Janeiro de 1999. Perguntámos ao Brigadeiro Idílio Freire, que chefia a BLI, se pode considerar a missão cumprida. A resposta é afirmativa: "Foi o primeiro Agrupamento da BLI em terras bósnias e não desmereceu em nada o desempenho dos anteriores batalhões. Digo isto atendendo às manifestações de interesse e carinho que fomos recebendo por parte das entidades militares bósnias, também das Organizações não Governamentais (ONG), ou ainda das próprias entidades diplomáticas creditadas naquele país. Todos são unânimes em considerar o trabalho dos militares portugueses como impecável, intocável mesmo. E isto não apenas no que concerne ao estrito cumprimento das normas estabelecidas pelos acordos de Dayton, mas também no que se refere ao relacionamento com as populações. Esse relacionamento desenvolveu-se independentemente das facções que existem no terreno, tentando mesmo e com alguns frutos visíveis, aproximar instituições e pessoas até aqui desavindas. Foi um relacionamento proveitoso, o que conseguimos estabelecer, e que facilitou o cumprimento da nossa missão. Posso mesmo afirmar, sem margem para dúvidas que, no âmbito dos assuntos civis, caso da ajuda humanitária a certas instituições, o nosso desempenho foi altamente prestigiante para o Exército português e, consequentemente, para o nosso país" -- afirma Idílio Freire, lembrando a seguir as vantagens da nossa presença na Bósnia:

"O que é que ganhamos com a nossa permanência ali? É uma missão de política externa do Estado português, importa lembrar isso, um Estado que se insere na Europa, com interesses e preocupações comuns aos dos outros países da União Europeia e não só. Hoje em dia, a missão clássica de defesa do território nacional, o perigo de sermos atacados ou invadidos não se vislumbra. Esse facto acontece com muitos dos países desenvolvidos, cujos militares aproveitam estas missões para acompanhar a evolução dos exércitos de outras nações. Para além de contribuirmos, de forma empenhada, para o sucesso da missão de paz que a SFOR desenvolve na Bósnia, há outros benefícios. Lembro o caso da primeira Guerra do Golfo, há uns anos atrás. Não participámos nela, em consequência não recebemos nada também. Em meu entender, era preferível termos participado. Em termos pessoais, ao nível dos quadros permanentes, o facto de se encontrarem, na Bósnia, ligados a chefias internacionais, permite-lhes uma prática de comando e Estado Maior que se constitui numa experiência única, um aperfeiçoamento extremamente importante".

As coisas estão a complicar-se, nos Balcãs, olhos postos no Kosovo. Se a guerra deflagrar de novo na Bósnia, os militares portugueses devem continuar as suas missões? "Se Portugal assumiu o compromisso de estar nesta aliança tem que arcar com as consequências até ao fim. Os contingentes em serviço na Bósnia foram preparados de forma exaustiva para não sofrerem baixas. Por outro lado, há em Portugal, permanentemente, forças de reserva prontas para socorrer os camaradas em serviço na Bósnia, caso surja alguma emergência grave. Agora, é evidente que ninguém reage bem à eventualidade de sofrermos baixas; a opinião pública tem, como é sabido, papel muito importante num cenário deste tipo. Há receio dos familiares, mesmo em situação de paz. Recebemos muitos pedidos de familiares de militares, que não queriam que os seus filhos fossem para a Bósnia. Mas os nossos jovens receberam uma boa formação, inscreveram-se como voluntários, e eram eles a contrariar a família. Somos maiores de idade, somos adultos, somos responsáveis, e queremos ir, era a resposta que nos davam. Desejando que a paz se radique definitivamente na Bósnia, uma coisa lhe posso dizer: se a situação se complicar, o que não pode acontecer, de forma nenhuma, é virmos embora!"

Os últimos desenvolvimentos no terreno parecem indicar que a "paz armada" se tende a eternizar por aquelas bandas. Em seu entender, quanto tempo mais ficarão os militares portugueses na Bósnia? "Tenho dúvidas que a nossa presença, assim como a dos contingentes de outros países termine nos próximos tempos. Em Janeiro segue outro batalhão nosso, um outro já se encontra a fazer a preparação para a eventualidade de render, em Junho, o que segue no início do ano. Isto apesar dos acordos internacionais preverem a presença da NATO na Bósnia só até Julho de 1999. O mais natural é que essa permanência se prolongue. Se assim acontecer, a BLI estará presente, de novo, na Bósnia, no primeiro semestre do ano 2000".